MEP vai ser extinto enquanto partido político

Congresso Nacional toma a decisão

Tempo de nascer, Tempo de morrer, Tempo de recomeçar

Discurso de Encerramento do IVº Congresso do MEP (Rui Marques)

O IVº Congresso do MEP - Movimento Esperança Portugal, reunido Sábado, 28 de Janeiro de 2012, no Porto, decidiu iniciar o processo legal de extinção enquanto partido político.

Fá-lo pelas seguintes razões:

1. Em democracia, a vontade dos eleitores, expressa através do voto, é soberana e deve ser respeitada e interpretada pelos que se dispõem a servir o bem comum através da política. Em quatro anos de vida e outros tantos actos eleitorais, o MEP não alcançou a confiança do número suficiente de eleitores para que tivesse voz parlamentar, objectivo essencial para uma intervenção política eficaz numa democracia representativa, tirando daí as devidas consequências.

2. O sistema politico-mediático está construído para manter o status quo, bloqueando de várias formas todas as tentativas de renovação do sistema partidário português. O MEP, com os seus militantes e simpatizantes, tentou com todo o empenho e entusiasmo, construir uma alternativa credível de um novo partido. Com quatro anos de experiência efectiva, ficou claro para os seus membros que a renovação da política através da criação de novos partidos é, actualmente, inviável.

Os militantes do MEP reunidos em Congresso reafirmaram, no entanto, a sua firme determinação de continuar, no actual momento crítico que vivemos, a lutar pela renovação da política em Portugal, com a marca da árdua esperança, fazendo-o de múltiplas formas –
isoladamente ou em grupo; em partidos, sindicatos, associações, movimentos cívicos, universidades,…– de forma a continuar a servir o bem comum, motivação que a todos continua a inspirar. Não desistem de Portugal, só mudam de forma de intervenção.

O património simbólico e ideológico do MEP será transferido para uma associação cívica, com a mesma designação, que actuará no domínio dos movimentos cívicos, no seio da sociedade civil, contando desde já com a participação da esmagadora maioria dos actuais membros. Assim, enquanto partido político o MEP extingue-se, mas enquanto movimento cívico continuará a sua missão.


                                                          Porto, 28 de Janeiro de 2012

O Congresso do MEP acaba de decidir a extinção do nosso partido.

Decisão dura e amarga, mas inevitável e lúcida. A sabedoria do Eclesiastes tem hoje uma particular aplicação:

"Tudo tem o seu tempo determinado, e há um tempo para tudo.
Há um tempo de nascer, e um tempo de morrer;
Um tempo de plantar, e um tempo de arrancar o que se plantou;"

(Ecl. 3, 1-8)

Mas, ao contrário do que poderia ser esperado, este momento não é de luto, nem de derrota no essencial. Por isso importa sublinhar, sem hesitação, o sentido mais profundo do momento que estamos a viver.

O MEP nasceu nas nossas vidas e na sociedade portuguesa, para servir o desígnio do bem comum, dando voz no Parlamento a uma nova proposta política. Em nome da árdua esperança para Portugal, que tanta falta nos fazia e cada vez mais nos faltará,
saímos do conforto das nossas casas e arriscámos.

Arriscámos a constituição de um partido com uma nova forma de fazer política, pela positiva, fundada em valores humanistas de cidadania e de solidariedade, capaz de dar voz às causas da justiça social e da solidariedade.

Arriscámos contra a opinião de todos aqueles que nos diziam ser impossível entrar no sistema parlamentar português;

Arriscámos a entrar num terreno mal considerado e numa actividade pouco prestigiante;

E hoje, mesmo com a extinção do MEP, é tempo de nos orgulharmos de termos corridos esses riscos.

É que a honra não está na vitória ou nos objectivos alcançados. Isso é um fruto circunstancial do momento. O facto de termos tentado, sem nos pouparmos a nada e correndo riscos, em nome de uma causa justa é uma marca que nos honra e que permanecerá sem mácula para além do fim do MEP.

A primeira mensagem que quero deixar registada nesta minha última intervenção no MEP é a de profunda gratidão a todos os que acreditaram neste projecto.

O MEP é uma história extraordinária de generosidade, de entrega, de partilha e de utopia.

O MEP juntou gente ímpar, criou novas amizades e reforçou a nossa convicção de servir Portugal. Raras vezes tive o privilégio de ver tanta e tão boa gente, disposta a intervir politicamente, de uma forma tão genuína e focada no bem comum. Obrigado pelo que cada um de vós, e dos que aqui não puderam estar, deu a este projecto.

Mas a generosidade que nos moveu exige a capacidade de análise lúcida do passado, do presente e do futuro. E o caminho percorrido mostra-nos que a nossa disponibilidade para servir o bem comum através da política, através desta forma concreta de um novo partido político, deve chegar ao fim.

Sem pretender ser exaustivo, nem fazer análises que só à História compete, temos agora experiência vivida que a margem para a renovação no sistema partidário português, com uma proposta credível e construtiva é mínima.

Assumo com humildade, uma liderança fracassada, incapaz de ter ajudado a criar um novo partido no qual os portugueses depositassem o seu voto em número suficiente para que tivesse voz parlamentar. Tirei as devidas consequências no último acto
eleitoral com a minha demissão. Mas não seria intelectualmente honesto dizer que só aqui radica o nosso insucesso.

Nesta caminhada foi perceptível que há uma convergência terrível de três bloqueios que retiram quase toda a margem de renovação no sistema parlamentar: o bloqueio mediático, a armadilha do voto útil e a iniquidade do modelo de financiamento.

Sabemos todos bem de mais o que cada um destes obstáculos significa, para que que seja necessário dissecá-los. Mas, em algum momento, no futuro próximo, os eleitores portugueses deviam reflectir seriamente sobre as consequências para a vida
democrática que estes bloqueios provocam.

Em democracia, os eleitores podem não ter sempre razão, mas têm sempre a decisão com o seu voto.

Em relação ao MEP falaram quatro vezes. O MEP começou por ser o primeiro dos partidos sem representação parlamentar, com cerca de cinquenta mil votos e terminou como terceiro partido sem representação parlamentar com menos de metade dos votos iniciais, sendo ultrapassado em confiança dos eleitores por outros partidos como o PAN e o MPT. Os eleitores falaram e o MEP deve ouvir. Sem a arrogância de achar que estão errados, ou o autismo de querer recorrer a explicações rebuscadas para ignorar esse sinal.

Simplesmente, os eleitores portugueses não viram no MEP uma alternativa suficientemente atrativa para lhe dessem uma oportunidade.

E, de novo, com humildade e coragem, o MEP deve assumir esse facto.

A decisão hoje tomada é acima de tudo, um novo exercício de dignidade. Dignidade de terminar, com a mesma dignidade com se começou: Cabeça erguida, olhar no horizonte, sendo capaz de dizer, como Pedro Arrupe, “Para o passado, ámen; Para o
futuro, aleluia”.

E a minha última palavra é sobre o futuro.

Com o fim do MEP, morre também a esperança?

Se assim fosse, nada teria feito sentido. Seria uma traição grave ao que nos moveu e fez construir esta experiência única. Cada um de nós é portador para o futuro desta chama da esperança.

De uma forma que se reconfigurará através da participação
noutros quadros institucionais – seja partidos, associações, sindicatos, movimentos, ou associação cívica MEP… – cada MEP deve continuar a ser embaixador da árdua esperança. De uma esperança inteligente que escolhe em cada momento o caminho mais eficaz para se tornar efectiva e não ser simples lirismo.

Mais do que nunca, Portugal e o mundo precisam de vozes de uma esperança activa e realista, que não se deixa aprisionar em becos sem saída, nem deixa esgotar a sua energia em areias movediças.

Cada um de nós partirá para novas missões de serviço ao bem comum, onde for mais necessário e mais urgente. Juntos umas vezes, separadamente, noutras, não deixaremos de cumprir a razão mais profunda da nossa existência. Pela minha parte,
regresso à intervenção cívica no contexto da sociedade civil, ao serviço da solidariedade tão urgente nestes tempos de crise.

E é exactamente por isso que o MEP não morre aqui. Hoje, apenas se transforma.

Deixa de ser um partido político mas continua a ser o espírito de serviço ao bem comum que habita cada um de nós e que se expressará futuramente de muitas formas.

Por isso, é necessário completar através da nossa determinação o excerto do Eclesiastes “Há um tempo para começar e há um tempo para acabar.”

Hoje… é tempo de recomeçar.